molde | francisco franca | 05 a 26 de agosto de 2023



MOLDE | FRANCISCO FRANCA

05 de agosto > 26 de agosto de 2023

 No final de 2021, numa postagem em que mostrava diversos trabalhos, escrevi a seguinte legenda; "Alguns trabalhos da série Cópias que estou fazendo na crença de estar seguindo os passos de outros e chegando a resultados muito semelhantes ou ainda uma declaração no sentido de deixar claro que não viso expressar meus sentimentos através da liberdade da pintura”, um texto algo reativo, natural de alguém da minha idade, tentando pactuar com o tempo que já não domina, mas no qual ainda respira. De lá para cá, não mudaria uma vírgula, mas não há mais hoje traço algum de resistência. A intuição de se relativizar a "autoria" ou a ideia de neutralidade para se entender a existência de um espaço onde se reage a sons, cores, formas, ideias, figuras, gestos, textos e tudo mais que não estava lá antes, permanece.

  

A série Cópias à qual me refiro acima é uma sequência numerada de trabalhos de mesmo formato na qual, por falta de uma proposta narrativa, deixo de lado a figuração para lidar com formas básicas que ou já tratava como fundo do meu trabalho anterior ou tomava como referência do trabalho de outros artistas. Eventualmente, esta coleção desenvolveu uma identidade própria e um sentido complementar à ironia inicial que me serviu de gatilho; Copiar a mim mesmo e aos outros.

  

Já "Molde", que dá nome a esta exposição, é a técnica que utilizo. São recortes em vinil usados como estêncil (molde vazado) para a aplicação de tinta sobre uma superfície de madeira. O objetivo prático deste procedimento é simular volumes que vêm do espaço virtual do interior do quadro para fora, tentando (de forma igualmente virtual) atenuar a existência de suas bordas. Esta técnica de moldagem é também o conceito do trabalho.

 

 A melhor definição que encontrei para a palavra "molde" dizia: "Objeto sólido de formato oco, destinado a ser preenchido por uma substância mais ou menos fluida que, ao solidificar, assume a forma exata desse vazio". Sendo assim, para haver a cópia, torna-se necessário haver também um original para gerar o vazio do molde que a precede. Extrapolando arbitrariamente a ideia de um original fundamental e atemporal, pode-se imaginar (e somente imaginar) que o original seja a obra, o molde o contexto e a cópia a autoria. Dessa forma, elevada ao absurdo, uma mesma obra poderia ter vários autores, sendo a única diferença entre elas - invisível, porém real - o contexto cultural e temporal em que foram produzidas e re-produzidas. Salvo a analogia artesanal, esta é a história magnificamente concebida do conto "Pierre Menard, Autor do Quixote" de Jorge Luis Borges.

 

 Sendo esta uma ideia controversa cuja discussão vai muito além do meu conhecimento, concentro-me apenas no percurso simples que leva da cópia ao original (e vice-versa) como norte para realizar meu trabalho. Quero acreditar que a mecânica desse percurso não só seja uma analogia válida para descrever esse “espaço surgido do nada”, como também uma forma de o preencher. Isto posto, quero primeiro agradecer à Mercedes Viegas pela oportunidade de retomar uma carreira que ficou pausada durante 22 anos, durante os quais testemunhei nas paredes da Galeria uma quantidade imensa de artistas que admiro exporem, sendo para mim uma honra poder fazer o mesmo. E finalmente dedicar o trabalho à Kika Kalache, minha mulher, sem a qual nada disso seria minimamente possível.

Francisco Franca


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