Wabi | Miri Felix
Wabi | Mii Felix
05 de julho > 28 de julho de 2023
Texto de André Seffrin
Janelas para a epifania
Artista de confrontos e alumbramentos, Miri Felix trabalha seus secretos inventos com um indisfarçável ludismo encantado.
Sua máscara negra de múltiplos olhos azuis, Just looking, é denúncia incômoda no horizonte mais largo do outro, de todos que ali cabem, equivocados ou esclarecidos. Do mesmo modo, Nickname, máscara branca telada (esconderijo ou jaula?), que prenuncia talvez a falsa proteção dos disfarces. O dúbio e o cisma em ambas é um grito. E transitam essas duas imagens totêmicas no mesmo corredor de espanto em que nos abismam cada vez mais as contendas de um mundo estranho a si mesmo, e que ainda é nosso – ainda humano, apesar de tudo. Já a máscara Dante seria um ponto de equilíbrio, quem sabe a união possível diante dos conflitos que as duas inicialmente citadas anunciam?
Esses encantamentos em Miri se dão em geral por meio do surrealismo (Just Looking, Quintessence) e não deixam de ser além disso uma busca de nossas possíveis identidades ancestrais. Mas há outros sinais de alerta em seus trabalhos, como cores antes sequestradas e que sobre linho e papel ela agora nos devolve sob uma luz solar (até uma claridade diáfana que lembra Guignard é perceptível nesses trabalhos). Assim, na tinta acrílica, em que as intencionais dobras na tela interferem nos efeitos de cor e textura, ou em cerâmica esmaltada, suas cores e formas atuam sempre em constantes alusões provocativas. Como se fossem convites a um sereno desespero – sintetizados no “Wabi”, a provada beleza do imperfeito, do irregular, nossos desajustes ao alcance de um oásis de entendimento e aceitação – sem nunca perder de vista o horizonte lúdico.
Filha de poetas, Miri ela mesma em sua obra pode se reconhecer poeta (como Tunga se reconhecia e de fato é), porque esses seus inventos têm também na palavra – e os títulos que adota evidenciam isso – uma ou mais janelas para a epifania.
André Seffrin